
Por Rafael Paganotti
Death Stranding é uma poderosa metáfora sobre a condição humana, o isolamento e a necessidade vital de construir pontes.
Desde seu lançamento, Death Stranding tem sido um divisor de águas. Criticado por alguns como um “simulador de correios” ou um jogo tedioso de longas caminhadas, ele foi, e ainda é, apaixonadamente amado por muitos outros. O fato é inegável: a obra de Hideo Kojima é diferente de tudo o que o mundo dos games já viu.
Minha experiência com Death Stranding transcende a gameplay. É uma jornada emocional e intelectual que me cativou desde o primeiro momento.
O Mundo de Sam Porter BridgesO cenário é um mundo apocalíptico onde fenômenos estranhos, como as aterrorizantes Entidades de Extinção (EEs) / (EPs) e a devastadora Chuva Temporal (Timefall) que acelera o tempo e a deterioração de tudo o que toca, forçaram os sobreviventes a se isolarem em bunkers, perdendo o contato humano.
Assumimos o papel de Sam Porter Bridges. O sobrenome “Bridges” (Pontes) já é uma pista da nossa missão: não se trata apenas de entregar mercadorias de bunker em bunker, mas sim de atuar como uma ponte, unindo e reconectando as pessoas através da Rede Quiral. Abstratamente, essa é a essência do jogo. Lembro-me da pandemia de COVID-19, quando o mundo se isolou, e o jogo ressoou em mim como um espelho de nossa necessidade intrínseca de estarmos ligados, mesmo em meio ao medo e à desconexão.
A Profundidade do Enredo e a Entidade Misteriosa
A narrativa é lindíssima e extremamente bem produzida. O jogo mergulha na história de uma fatalidade que chega ao mundo por meio de uma entidade que, periodicamente, vem à Terra para causar extinções e renovar o ciclo da vida, como aconteceu com os dinossauros.
No entanto, há um desvio nessa trajetória. Essa entidade desenvolve uma afinidade e sentimentos por Sam, desde quando ele era um bebê. Esse laço, que seria impossível para uma entidade apocalíptica, a leva a tentar retardar o fim do mundo, movida pelo sacrifício e pela dedicação de Sam em ajudar o próximo. É um enredo de cortar o coração.
O Mistério do BB (Bridge Baby)
Um elemento central e de grande emoção é o bebê que Sam carrega consigo. Ele é um Bridge Baby (BB), um feto retirado do útero de uma mãe com morte cerebral (uma “Stillmother”) e colocado em uma cápsula de suporte.
- Função: O BB é essencialmente um detector de EEs / EPs. Ele permite que Sam, ao se sincronizar com ele, “enxergue” as entidades presas entre o mundo dos vivos e o dos mortos (a “Praia”). Sem o BB, Sam estaria completamente vulnerável.
- Conexão Emocional: O BB é mais do que uma ferramenta. A necessidade de acalmá-lo, interagir e protegê-lo cria uma forte conexão emocional com o jogador. Ele representa a fragilidade, a esperança e o futuro que Sam está literalmente carregando e defendendo em suas costas.
A Gameplay: Uma Lição de Vida
Para além do enredo, a gameplay em si carrega mensagens profundas. O ato de caminhar sozinho, enfrentando inúmeras dificuldades, obstáculos, e sentindo a tentação de desistir, é visceral. Mas quando não desistimos, quando nos esforçamos e chegamos ao nosso destino, somos recompensados com vistas de tirar o fôlego e músicas incríveis que nos fazem arrepiar.
Para mim, o jogo compara a caminhada de Sam com a nossa própria jornada na vida:
Estar sozinho, desmotivado, desanimado, querendo desistir por causa das dificuldades. Mas a vida, assim como a gameplay, nos ensina que no final de cada caminhada, cada sacrifício vale a pena. Nossos esforços são recompensados.
O Sistema Revolucionário de Conexão
Uma das mecânicas mais brilhantes e que melhor reforça a mensagem do jogo é o seu sistema de ajuda comunitária. Death Stranding não é um multiplayer tradicional, mas possui um sistema assíncrono que é pura genialidade.
Se um jogador em qualquer lugar do mundo constrói uma escada para atravessar uma fenda nas montanhas, essa mesma estrutura pode aparecer no jogo de outra pessoa. Não nos vemos, mas sentimos a presença e a ajuda um do outro através de estradas, pontes, geradores e likes virtuais.
Essa mecânica é a prova máxima da filosofia do jogo: Precisamos nos unir e construir pontes, mesmo quando estamos isolados. É um jogo que, por meio de uma premissa excêntrica, celebra o lado humano da cooperação.
Minha Experiência em Death Stranding 2: On The Beach
A chegada do Death Stranding 2: On The Beach elevou ainda mais o nível. Já dediquei muitas horas a ele, e posso dizer que a experiência está mais incrível:
- Gameplay Refinada e Recursos Novos: A jogabilidade foi aprimorada, com Sam mais fluído e a introdução de novos recursos e equipamentos que dão mais opções de abordagem, seja no combate mais direto ou na furtividade. A variedade de ferramentas, como o Esqueleto Bokka e novas armas, torna a experiência mais dinâmica.
- Mundo Aberto Absurdo: Os gráficos continuam absurdos, potencializados pela Decima Engine. O jogo nos leva a novos terrenos, com paisagens radicais e mudanças climáticas que influenciam diretamente a jogatina. No novo enredo, acompanhamos Sam e Fragile (agora capitã de uma grande nave) em uma missão para conectar novas regiões, como o México e a Austrália, com o DHV Magellan servindo como uma base principal móvel.
- História Envolvente e Emocionante: O enredo, que se passa onze meses após o primeiro jogo, aprofunda os temas de luto e conexão, com reviravoltas fantásticas e um foco maior na existência do BB a cada cena emocionante.
- O Toque de Kojima: Conexão e Reflexão: O lendário Hideo Kojima, que chegou a reescrever partes do jogo para garantir que ele não fosse mainstream demais, demonstra novamente sua intenção filosófica: a de que o jogo deve dar às pessoas “energia para viver e serem felizes”, fazendo-as encontrar alegria na vida através de suas histórias. Ele inclusive levanta uma questão intrigante para esta sequência: “Deveríamos ter nos conectado?”, sugerindo que o excesso de laços também pode levar à fragmentação.
Death Stranding, em suas duas iterações, é, para mim, um game revolucionário. Ele é mais do que um jogo de ação e aventura; é uma poderosa metáfora sobre a condição humana, o isolamento e a necessidade vital de construir pontes. É uma obra indispensável!
Rafael Paganotti.
https://youtu.be/GEVQ4TEieFc
