Esqueça tudo o que você conhece sobre Paul Atreides, a profecia e os épicos de messianismo interplanetário. Em Dune: Awakening, Paul simplesmente… não nasceu. E isso muda tudo. Arrakis está ainda mais descontrolada, mergulhada num caos político entre Atreides e Harkonnen, com uma guerra civil fervendo no calor das dunas e os Fremen desaparecidos do mapa. No meio desse deserto fervente de conspiração e poeira, você é um agente Bene Gesserit enviado com uma missão absurdamente ingrata: encontrar os Fremen, restaurar o equilíbrio e, de quebra, “despertar o ADORMECIDO”, sim, aquele mesmo, no singular e em caixa alta.
A proposta aqui não é ser o herói épico, mas alguém sobrevivendo por um fio enquanto tenta cavar relevância política com uma colher de plástico. O universo de Dune se apresenta em sua forma mais crua, sem o glamour das adaptações hollywoodianas. É suado, é brutal e, dependendo da sua sede, pode ser fatal. A história não segue uma trama linear, mas sim um mundo vivo (e cruel) onde cada jogador trilha seu caminho em meio a alianças, traições, facções em guerra e claro, vermes gigantes com complexo de tubarão.
Ao contrário de um RPG clássico, aqui não há um roteiro definido te guiando (Há uma história principal que te apresenta aos recursos do jogo). A narrativa é construída por você e pelos outros jogadores, em tempo real, como se cada servidor fosse um tabuleiro de guerra orgânico. A política é real, o conflito é constante, e a sobrevivência, honestamente, nunca foi tão bem roteirizada pelo acaso. Em resumo, Dune: Awakening é o que acontece quando você tira o protagonista da história e joga todo mundo no deserto pra brigar por migalhas de especiaria.
JOGABILIDADE
Sobreviver em Arrakis é quase um reality show intergaláctico de sofrimento. Dune: Awakening não facilita em nada: seu personagem acorda no meio do deserto, desidratado, pelado e sendo vigiado por um verme do tamanho de um Boeing. A primeira missão? Não morrer nos primeiros 10 minutos (ok, to zoando, ou não?). Isso já exige saber usar o stillsuit, encontrar fontes de água, fugir de tempestades de areia e se esconder de qualquer coisa que pareça querer seu fígado.
A progressão é dividida em quatro estágios: sobreviver, defender, expandir e dominar. Parece aula de história antiga, mas aqui é na porrada e com crafting. Você começa construindo um abrigo improvisado (leia-se: uma tenda rasgada num penhasco), até evoluir para uma base com torres, escudos e até produção de especiaria própria. Cada escolha molda sua trajetória: você pode ser um explorador solitário, um comandante militar ou um político manipulador. Dá até pra ser o chato da guilda que só planta e nunca ajuda nos combates.
O combate é uma mistura de tensão e tática. Não é frenético como um FPS, mas tem aquele charme de “se errar esse golpe, morre e perde o loot”. Há armas corpo-a-corpo, armas de energia, escudos Holtzman que ativam automaticamente (absorvendo ataques leves e bloqueando pesados), e até ornithopters pra você sair voando dramaticamente ao pôr do sol, ou fugindo de PvP, o que é mais comum. O jogo também te permite escolher um “mentor” de facção, o que define perks únicos, seja focando em inteligência tática (Mentat), força bruta (Trooper), subterfúgio místico (Bene Gesserit) ou habilidades de combate (Swordmaster).
Explorar o mapa é uma tarefa séria: você precisa de equipamentos específicos pra entrar em áreas infestadas, resistir ao calor ou acessar ruínas antigas. Isso cria um senso de progressão muito bem feito. As masmorras, áreas subterrâneas e fortalezas abandonadas são recheadas de loot raro, lore oculto e armadilhas mortais. E claro, tudo pode ser interrompido por um jogador rival decidindo te transformar em adubo de areia. PvE e PvP se misturam naturalmente, com eventos públicos, facções se enfrentando por domínio e até combates políticos entre guildas que fariam Maquiavel bater palmas.
Se você gosta de jogos de sobrevivência com sistemas complexos, e não se importa em morrer de sede só porque esqueceu de ativar o filtro de água… bom, esse é o seu novo vício.










DIREÇÃO DE ARTE / TÉCNICA
Visualmente, Dune: Awakening é um espetáculo arenoso de cair o queixo. É tipo aquele pôster do deserto que você viu uma vez, mas agora com shaders em tempo real, partículas de poeira interativas e um céu que muda de cor conforme você chora de sede. A Funcom acertou em cheio ao captar a aridez opressiva de Arrakis. Não tem HUD piscando, brilho neon ou floresta colorida. Aqui, a beleza está no desespero: dunas que parecem se mover sozinhas, tempestades que engolem o horizonte e vermes que surgem do nada como se fossem o raio do Juízo Final com boca.
A engine Unreal 5 é usada com sabedoria. As superfícies têm textura digna de filme, a iluminação dinâmica impressiona e até o brilho da especiaria flutuando no ar consegue ser hipnótico, e meio psicodélico. As animações dos personagens ainda têm seus tropeços (o andar do personagem parece estar em estágio de reabilitação às vezes), mas em combates e interações de crafting, tudo flui bem, especialmente o sistema de clima: tempestades de areia surgem do nada, forçando jogadores a se abrigarem, alterando rotas e criando eventos imprevisíveis.
O design sonoro também merece uma salva de palmas abafadas pelo capacete stillsuit. Do silêncio opressor entre as dunas ao rugido dos vermes e o assovio das blades cortando o ar, o som é parte fundamental da imersão. A trilha sonora acerta em cheio no tom solene e misterioso do universo Dune. Tem momentos em que a música parece sussurrar “você vai morrer aqui mesmo”, e honestamente, às vezes ela está certa. Os sons de impacto e ativação do escudo Holtzman são especialmente satisfatórios, como se uma panela de pressão se envolvesse numa luta de sabres de luz.
No geral, é um jogo que parece ter sido feito com muito carinho por fãs do universo original. Mesmo com alguns bugs ocasionais (NPCs teleportando, hitboxes questionáveis e veículos travando em cascalho), Dune: Awakening se mantém tecnicamente estável para algo tão ambicioso. E isso é um milagre, considerando o tamanho da areia que a Funcom decidiu mover pra contar essa história.
- Jogo disponibilizado via Funcom
Dune: Awakening
Dune: Awakening é um colosso de areia, suor e ambição. Não é um jogo feito pra dar tapinha nas costas do jogador, ele te joga em Arrakis com um cantil furado e diz “se vira”. É um MMO survival que exige dedicação, leitura de ambiente, escolhas políticas e nervos de aço. E se você sobreviver à curva de aprendizado (e às tempestades, e aos vermes, e à falta de água), ele recompensa com uma das experiências mais imersivas do gênero.
Ele não é perfeito. O combate ainda precisa de polimento, a movimentação às vezes parece que seu personagem passou sabão nos sapatos, e a performance em eventos massivos pode sofrer. Mas a ambientação é um absurdo de boa, o sistema de construção e progressão é profundo, e a maneira como narrativa e multiplayer se entrelaçam cria histórias emergentes que nenhum jogo single-player conseguiria imitar.
Se você curte o universo Dune, ou se é fã de jogos como Rust, Ark ou Conan Exiles, mas quer algo com mais cérebro e menos “gritaria pelada”, este jogo é pra você. E mesmo que você nunca tenha lido uma página do Herbert ou visto o filme do Denis Villeneuve, ainda assim vai encontrar aqui um deserto hostil esperando para ser dominado.